DORA FERREIRA DA
SILVA
( 1918 - 2006
)
Dora Ferreira da Silva nasceu dia
1º de julho de 1918, na cidade paulista de Conchas, e faleceu em São paulo em
2006.
A vocação poética surgiu na
infância, através de leituras na biblioteca de poesia de seu pai, Theodomiro
Ribeiro, que faleceu quando Dora tinha um ano de idade. Com dois anos, mudou-se
com a família para a Capital do Estado, onde mais tarde estudou no Instituto de
Educação, da então recente Universidade de São Paulo.
Casou-se aos 19 anos com o
filósofo Vicente Ferreira da Silva, com quem viveu por 23 anos não apenas uma
história de amor e admiração, mas também uma intensa e fecunda parceria
intelectual. Ao lado do marido, relacionou-se com intelectuais do mundo inteiro,
como Agostinho da Silva, Eudoro de Souza e Ernesto Grassi, assim como Guimarães
Rosa e Oswald de Andrede, que frequentavam a casa da rua José Clemente,
referência cultural na cidade de São Paulo.
Em 1955, o casal fundou, ao lado
de Milton Vargas, a revista "Diálogo", interrompida em sua décima sexta edição
pela morte prematura de Vicente num acidente de carro. Dois anos depois, com a
colaboração de Vilém Flusser e Anatol Rosenfeld, Dora lançou a revista "Cavalo
Azul", voltada especialmente à poesia e à literatura. Dora publicou
sistematicamente artigos, traduções e poemas nas duas
revistas.
Entre as atividades docentes,
lecionou História e Arte na EAD e História das Religiões na Faculdade Tereza
Martin. Ao longo de sua vida reuniu e orientou vários grupos de alunos que
estudavam principalmente psicologia, mitologia e poesia. A criação do Centro de
Estudos Cavalo Azul, em 2003, incorporou outros professores e poetas, como
Rodrigo Petrônio e Cláudio Willer, que integravam o último grupo de estudos de
Dora, ainda em atividade.
A poesia foi a vivência, paixão e
prática de toda sua vida. A primeira publicação em livro foi em 1970, com a
coletânea "Andanças", que reuniu a poesia produzida a partir de 1948. Publicou
depois outros dez volumes, além de traduções, artigos e ensaios. Recebeu três
prêmios Jabuti pelos livros "Andanças", "Poemas da Estrangeira" e "Hídras", a
Menção honrosa PEN CENTRE por "Talhamar" e o prêmio Machado de Assis, da
Academia Brasileira de Letras, pela publicação da "Poesia Reunida", em
2000.
Integrou a comissão responsável
pela publicação da obra completa de Carl Gustav Jung em português, da qual foi
responsável por várias traduções, além do clássico "Memórias, Sonhos,
Reflexões".
Em 2006, aos 87 anos, Dora
preparava-se para lançar mais um livro. Estava em plena atividade, trabalhando
em três séries de poemas: "Appassionata", "O Leque" e "Transpoemas", esta
última em um mergulho na fonte originária da poesia, que não concluiu pois veio
a falecer.
Seu acervo documental e
bibliográfico foi incorporado ao Instituto Moreira Salles, onde, depois de
catalogado, está disponobilizado para pesquisa e divulgação, figurando ao lado
de nomes como Clarice Lispector, Lygia Fagundes Telles e Rachel de Queiroz,
dentre muitos outros escritores brasileiros.
CÂNTICOS
Tenho-te um amor de
mansidões
rebanho lento e branco passeando
na alvorada
tenho-te um amor tranquilo e
trêmulo
não se música ou se
constelações.
Tenho-te um amor de
eternidades
em vagas renascentes - brando som
de flauta
chamando as superfícies
distraídas
para a reconcentração
definitiva.
II
Como um ramo de úmidas
rosas
quisera estar na sala em que
respiras
o aroma de tuas
primaveras.
Como um cesto de frutos
derramados
quisera ser a oferta
abandonada
na mesa simples da tua
eternidade.
** **
**
AO SOL
Naufragas na
noite
em pompas de luz e
imensidade
todo germe palpita na
semente
e da nova manhã
ressurges
clara
divindade
nua a carnação sob o manto
escarlate.
** **
**
NOTURNO
Nossos olhos nos
pertencem,
não o dia.
Amor não nos
pertence
nem a morte.
Apenas pousam na pérola mais
fina,
Desce o luar
No flanco de rios
precipitados
Folhas se
alongam
caules
estremecem.
A noite já
desfere
seu punhal de
trevas.
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