Este blog tem por finalidade, homenagear consagrados poetas e escritores e, os notáveis poetas da internet.
A todos nosso carinho e admiração.

Clube de Poetas









domingo, 25 de janeiro de 2015

HERBERTO HELDER



Herberto Helder



Herberto Helder Luís Bernardes de Oliveira nasceu a 23 de Novembro de 1930 no Funchal, Ilha da Madeira, no seio de uma família de origem judaica. Em 1946, com 16 anos, viaja para Lisboa para frequentar o 6º e o 7º ano do curso liceal. Em 1948, matricula-se na Faculdade de Direito de Coimbra e, em 1949, muda para a Faculdade de Letras onde frequenta, durante três anos, o curso de Filologia Romântica, não tendo terminado o curso. Três anos mais tarde regressa a Lisboa, começando por trabalhar durante algum tempo na Caixa Geral de Depósitos e depois como angariador de publicidade, sendo que durante este tempo vive, por razões de ordem vária e pessoal, numa «casa de passe».
Em 1954, data da publicação do seu primeiro poema em Coimbra, regressa à Madeira onde trabalha como meteorologista, seguindo depois para a Ilha de Porto Santo. Quando em 1955 regressa a Lisboa, frequenta o grupo do Café Gelo, de que fazem parte nomes como Mário Cesariny, Luiz Pacheco, António José Forte, João Vieira e Hélder Macedo. Durante esse período trabalha como propagandista de produtos farmacêuticos e redator de publicidade, vivendo com rendimentos baixos. Três anos mais tarde, em 1958, publica o seu primeiro livro, "O Amor em Visita". Durante os anos que se seguiram vive na França, Holanda e Bélgica, países nos quais exerce profissões pobres e marginais, tais como: operário no arrefecimento de lingotes de ferro numa forja, criado numa cervejaria, cortador de legumes numa casa de sopas, empacotador de aparas de papéis e policopista. Em Antuérpia, viveu na clandestinidade e foi guia dos marinheiros no sub mundo da prostituição.

  

Repatriado em 1960, torna-se encarregado das bibliotecas itinerantes da Fundação Calouste Gulbenkian, percorrendo as vilas e aldeias do Baixo Alentejo, Beira Alta e Ribatejo. Nos dois anos seguintes publica os livros  "A Colher na Boca" , "Poemacto" e "Lugar" . Em 1963 começa a trabalhar para a Emissora Nacional como redator de noticiário internacional, período durante o qual vive em Lisboa. Ainda nesse mesmo ano publica "Os Passos em Volta"  e produz "A máquina de emaranhar paisagens". Em 1964 trabalha nos serviços mecanográficos de uma fábrica de louça, datando desse ano a sua participação na organização da revista Poesia Experimental. Nesse ano reedita ainda "Os Passos em Volta", escreve «Comunicação Académica» e publica "Electronicolírica" . Em 1966 participa na co-organização do segundo número da revista Poesia Experimental  e no ano seguinte publica "Húmus" , "Retrato em Movimento"  e  "Ofício Cantante"

  

Data de 1968 a sua participação na publicação de um livro sobre o Marquês de Sade, o que o leva a ser envolvido num processo judicial no qual foi condenado. Porém, devido às repercussões deste episódio consegue obter suspensão de pena, fato este que não conseguiu evitar que fosse despedido da Rádio e da Televisão portuguesas. Refugia-se na publicidade e, posteriormente, numa editora onde desempenha o cargo de co-gerente e diretor literário. Ainda nesse ano publica os livros " Apresentação do Rosto" , que foi suspenso pela censura, "O Bebedor Nocturno",  "Kodak"  e "Cinco Canções Lacunares".
Em 1970 viaja pela Espanha, França, Bélgica, Holanda e Dinamarca, publicando nesse ano a terceira edição de "Os Passos em Volta"  e escreve "Os Brancos Arquipélagos".

   


Em 1971 desloca-se para Angola onde trabalha como redator numa revista. Enquanto repórter de guerra, é vítima de um grave desastre tendo que ser hospitalizado durante três meses. Data ainda desse ano a publicação de "Vocação Animal"  e a produção de "Antropofagias" . Regressa a Lisboa e parte de novo, desta vez para os E.U.A., em 1973, ano durante o qual publica "Poesia Toda" , obra que contém toda a sua produção poética.  Em 1975 passa alguns meses na França e Inglaterra, regressando posteriormente a Lisboa onde trabalha na rádio e em revistas, meios restritos de sobrevivência econômica. Em 1976, Herberto Helder participa na edição e organização da revista Nova  que, sendo posterior à revolução de 25 de Abril de 1974, reconhecia na Literatura Portuguesa características que a aproximaram às Literaturas latino-americana, africana e espanhola, declinando uma direção literária revolucionária cuja atividade não ultrapassou o plano teórico devido à instabilidade política portuguesa . Nos anos que se seguiram publicou as obras "Cobra"; "O Corpo, O Luxo, A Obra" e "O Photomaton e Vox" .
 A última referência encontrada da instabilidade biográfica de Herberto Helder referia-se ao fato de o poeta ter abandonado todas as suas anteriores atividades e de viver no mais cioso dos anonimatos.


SOBRE POEMA
Um poema cresce inseguramente
na confusão da carne,
sobe ainda sem palavras, só ferocidade e gosto.
talvez como sangue
ou sombra de sangue pelos canais do ser.
Fora existe o mundo. Fora, a esplêndida violência
ou os bagos de uva de onde nascem
as raízes minúsculas do sol.
Fora, os corpos genuínos e inalteráveis
do nosso amor,
os rios, a grande paz exterior das coisas,
as folhas dormindo o silêncio,
as sementes à beira do vento,
a hora teatral da posse.
E o poema cresce tomando tudo em seu regaço.
E já nenhum poder destrói o poema.
Insustentável, único,
invade as órbitas, a face amorfa das paredes,
a miséria dos minutos,
a força sustida das coisas,
a redonda e livre harmonia do mundo.
- Embaixo o instrumento perplexo ignora
a espinha do mistério.
- E o poema faz-se contra o tempo e a carne.
** ** **
SE HOUVESSE DEGRAUS NA TERRA...
Se houvesse degraus na terra e tivesse anéis o céu,
eu subiria os degraus e aos anéis me prenderia.
No céu podia tecer uma nuvem toda negra.
E que nevasse, e chovesse, e houvesse luz nas montanhas,
e à porta do meu amor o ouro se acumulasse.
Beijei uma boca vermelha e a minha boca tingiu-se,
levei um lenço à boca e o lenço fez~se vermelho.
Fui lavá-lo na ribeira e a água tornou-se rubra,
e a fímbria do mar, e o meio do mar,
e vermelhas se volveram as asas da águia
que desceu para beber,
e metade do sol e a lua inteira se tornaram vermelhas.
Maldito seja quem atirou a maçã para outro mundo.
Uma maçã, uma mantilha de ouro e uma espada de prata.
Correram os rapazes à procura da espada
e as raparigas correram à procura da mantilha,
e correram, correram as crianças à procura da maçã.
** ** **
FONTE
Ela é a fonte. Eu posso saber que é
a grande fonte
em que todos pensaram. Quando no campo
se procurava o trevo, ou em silêncio
se esperava a noite,
ou se ouvia algures na paz da terra
o urdir do tempo...
Cada um pensava na fonte. Era um manar
secreto e pacífico.
Uma coisa milagrosa que acontecia
ocultamente.
Ninguém falava dela, porque
era imensa. Mas todos a sabiam
como a teta. Como o odre.
Algo sorria dentro de nós.
Minhas irmãs faziam-se mulheres
suavemente. Meu pai lia.
Sorria dentro de mim uma aceitação
do trevo, uma descoberta muito casta.
Era a fonte.
Eu amava-a dolorosa e tranquilamente.
A lua formava-se
com uma ponta sutil de ferocidade
e a maçã tomava um princípio
de esplendor.
Hoje o sexo desenhou-se. O pensamento
perdeu-se e rensceu.
Hoje sei permanentemente que ela
é a fonte.



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